sexta-feira, 23 de novembro de 2018

SOLDADINHO PRIMATA

SOLDADINHO PRIMATA
Num lugar qualquer, longe da civilização, havia um
acampamento de primatas com 105 indivíduos, sendo 57
na cor branca e 47 na cor parda. Só um era diferente: era
dourado, reluzente, bonito. Sorria para tudo e para todos.
Prometia reformar o lugar qualquer num paraíso para
todos. O único defeito do diferente era quando soltava a
voz. Fazia cinco vozes diferentes, portanto difícil
identificar de onde partia o rugido. Apenas uma
característica o identificava: ao rugir, via de regra,
vomitava bobagens que causavam grande impacto.
Certo dia, o acampamento foi dado de presente ao
primata maior, o diferente, chefe do grupo branco
conhecido como deslumbrado, que ficou maravilhado e
eufórico. Logo colocou tudo em ordem unida em frente ao
acampamento, de onde conseguiria ver todos os outros
brinquedos, entre os quais uma pequena árvore florida que
estava postada na entrada de uma grande cavidade
existente numa frondosa árvore.
A pequena árvore florida era muito bonita. Tinha
ramos erguidos em arco que cobriam a copada, e um dos
troncos dobrado para trás, tão dobrado que ficava
escondido debaixo dos ramos em arco.
O primata diferente, aquele reluzente, logo se
encantou pela arvorezinha, pensando que tal como ele, a
arvorezinha tão linda, tivesse um só tronco.
Certo dia, o primata diferente e reluzente, ao arrumar
seus brinquedinhos, que iam de arcos e flechas a tacapes
e boleadeiras, deixou que um primata caísse para fora do
acampamento. Então, o primata reluzente e deslumbrado
saiu correndo a procurar pelo primata desviado. Pouco
tempo depois passaram outros primatas e um deles viu o
fugitivo e exclamou: “Um primata militar! Um primata
militar”!
Será que alguém, propositadamente, o deixou fugir
porque ele é diferente? E o que deverá ser feito com os

diferentes? Seria necessário, pelo menos, mais que os 57
para fazer uma boa batalha, disse um dos brancos.
Tenho uma ideia, disse aquele que avistou o fugitivo.
Vamos colocar os que faltam para uma boa batalha numa
jangada e manda-los dar uma volta, primeiro rio abaixo e
depois rio acima. Se chegarem vivos de volta, servirão
para as batalhas que se aproximam.
E assim fizeram. Construíram uma jangada, bem
grande e pesada, colocaram os deslumbrados a bordo e a
soltaram rio abaixo, para navegar na água que corria pela
sarjeta.
Apoiado em sua única perna, em “ombro armas”, o
diferente, deslumbrado mor, soldadinho de chumbo,
procurava não cair da jangada. Voltava todos os seus
desejos e pensamentos para a linda arvorezinha florida,
que talvez, encoberta pelo deslumbramento, nunca mais
voltasse a vê-la.
A água ganhou mais correnteza e a jangada andou
com maior força. A água caía em cascata desde o STF até
o lago da primeira instância. O deslumbrado tentou se
equilibrar mas a jangada deu um salto, caiu da cascata,
virou e o deslumbrado afundou.
Mal o deslumbrado tinha chegado ao fundo do Rio,
apareceu um enorme tubarão chamado Bertolt Brecht,
vulgo aliado, e abriu a enorme bocarra para salvar o
deslumbrado soldadinho de chumbo. Mesmo assim, o
deslumbramento não permitiu que esboçasse qualquer
reação para salvar sua vida, gastando os últimos instantes
para pensar em sua arvorezinha florida que ficara próxima
do acampamento.
Passou-se longo tempo, e de repente apareceu uma
nova operação, daquelas que salvam a honra de qualquer
acampamento, e o tubarão foi pescado pelos primatas
dissidentes do acampamento. Ao limpar o tubarão, o
soldadinho deslumbrado foi encontrado, porém já estava
morto.

A ESCOLINHA
A escolinha do Zezinho é um espetáculo. A parte
pedagógica está entregue ao professor General de
Campos, titulado na ANT – Academia Nacional da
Truculência, nos EUA – Educandários Únicos Aceitos. Tem
como metas principais o respeito à hierarquia e à
disciplina.
Os alunos, ao chegar, precisam bater continência ao
diretor pedagógico e ao diretor administrativo. O uniforme
consiste em calças verde oliva, gandola da mesma cor e
casquete.
Antes do início das aulas, após a execução dos hinos,
uma sessão de ordem unida de 30 minutos. Após a sessão,
em forma, sem cadência, ordem unida, classe por classe,
os recrutas deverão rumar para suas salas, entrando em
fileiras a partir da direita, tomando seus lugares
previamente determinados.
O setor administrativo, dirigido por Sermoro Rei,
consiste em duas salas amplas, com muitos funcionários. A
maior, denominada quartel, tem na hierarquia e na
disciplina seu principal fundamento. Todos os funcionários
pertencem ao grupo subalterno, já que ao oficialato são
reservados os cargos de nível superior.
A segunda sala, denominada Delegacia, ocupa-se da
fiscalização das atividades do funcionalismo e do corpo
docente, para evitar qualquer desvio de conduta e a
criteriosa obediência ao planejamento das operações.
O resultado planejado e que será perseguido
diuturnamente, e a formação de um contingente de
autômatos, capaz de caminhar e obedecer, o que é julgado
mais que suficiente para uma população que escolheu um
nada para dirigir seu destino.