segunda-feira, 4 de dezembro de 2017

Anarquismo ou Sociedade sem Estado



Como funcionaria uma sociedade sem estado
Instituto Ludwig von Mises Brasil
há 3 anos
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Este artigo é a segunda e última parte da entrevista concedida por Hans-Hermann Hoppe à revista Wirtschaftswoche, o principal semanário da Alemanha sobre economia e negócios, e foi conduzida por Malte Fischer. A primeira parte, que versou sobre economia global e secessão, pode ser lida aqui.
Independentemente do número de territórios soberanos, ainda resta a questão do tamanho do governo. Os liberais clássicos sugerem que o estado seja um mero 'guarda noturno', o qual se limita a garantir a liberdade, a propriedade e a paz. Mas o senhor não quer estado nenhum. Por quê?
Os liberais clássicos subestimam a inerente tendência de qualquer arranjo estatal ao inchaço. Essa é uma propensão irreversível. Quem determina quantos policiais, quantos juízes e quantos soldados — todos eles financiados por impostos — haverá em um estado mínimo voltado exclusivamente para a segurança e para os serviços judiciais?
No mercado, onde bens e serviços são demandados e pagos voluntariamente, a resposta é clara: leite será produzido no volume que os consumidores desejam e vendido aos preços que os consumidores estão dispostos a pagar. Por outro lado, no que tange ao governo de qualquer país, essa pergunta de "quanto?" será sempre respondida da mesma maneira: quanto mais dinheiro você nos der, mais poderemos fazer por você.
Dado que o governo pode obrigar seus cidadãos a pagar impostos, o governo sempre irá exigir cada vez mais dinheiro e, em troca, ofertará serviços de qualidade cada vez pior, dado que o governo não opera em ambiente concorrencial. A ideia de um estado mínimo, principalmente em uma democracia, é um projeto conceitualmente falho. Estados mínimos jamais permanecem mínimos.
Então não deveria haver estado nem sequer para proteger a propriedade, e para fornecer serviços de segurança e de justiça?
Se o estado for proteger a propriedade utilizando uma polícia estatal, então ele terá de coercivamente coletar impostos. No entanto, impostos são expropriação. Desta maneira, o estado paradoxalmente se transforma em um expropriador protetor da propriedade. Não faz sentido. Ademais, um estado que quer manter a lei e a ordem, mas que pode ele próprio criar leis, será ao mesmo tempo um transgressor e um mantenedor da lei.
E isso tem de ficar claro: o estado não nos defende; ao contrário, o estado nos agride, confisca nossa propriedade e a utiliza para se defender a si próprio. A definição padrão do estado é essa: o estado é uma agência caracterizada por duas feições exclusivas e logicamente conectadas entre si. Primeiro, o estado é uma agência que exerce o monopólio compulsório da jurisdição de seu território; o estado é o tomador supremo de decisões. Ou seja, o estado é o árbitro e juiz supremo de todos os casos de conflito, incluindo aqueles conflitos que envolvem ele próprio e seus funcionários. Não há qualquer possibilidade de apelação que esteja acima e além do estado. Segundo, o estado é uma agência que exerce o monopólio territorial da tributação. Ou seja, é uma agência que pode determinar unilateralmente o preço que seus súditos devem pagar pelos seus serviços de juiz supremo. Baseando-se nesse arranjo institucional, você pode seguramente prever quais serão as consequências:
a) em vez de impedir e solucionar conflitos, alguém que possua o monopólio da tomada suprema de decisões irá gerar e provocar conflitos com o intuito de resolvê-los em benefício próprio. Isto é, o estado não reconhece e protege as leis existentes, mas as distorce e corrompe por meio da legislação. Contradição número um: o estado é, como dito, um transgressor mantenedor das leis.
b) em vez de defender e proteger alguém ou alguma coisa, um monopolista da tributação irá invariavelmente se esforçar para maximizar seus gastos com proteção e ao mesmo tempo minimizar a real produção de proteção. Quanto mais dinheiro o estado puder gastar e quanto menos ele tiver de trabalhar para obter esse dinheiro, melhor será a sua situação. Contradição número dois: o estado é, como dito, um expropriador protetor da propriedade.
Então, para quem o senhor gostaria de transferir a tarefa de proteger direitos e propriedade?
Tais tarefas devem ser realizadas por aquelas empresas privadas que comprovadamente demonstrarem competência em um mercado livre e concorrencial — exatamente como ocorre com os outros serviços.
Em uma sociedade de leis privadas, a produção de lei e ordem — de segurança — seria feita por indivíduos e agências livremente financiados, concorrendo entre si por uma clientela disposta a pagar (ou a não pagar) voluntariamente por tais serviços — exatamente como ocorre com a produção de todos os outros bens e serviços. Como esse sistema funcionaria é algo que pode ser mais bem compreendido ao contrastarmos tal sistema com o funcionamento do nosso atual e totalmente conhecido sistema estatista.
Se quisermos resumir em uma única palavra a diferença (e a vantagem) decisiva entre uma indústria de segurança operando em ambiente concorrencial e a atual prática estatista, essa palavra seria: contrato.
O estado opera em um vácuo jurídico. Não existe nenhum contrato entre o estado e seus cidadãos. Não está determinado contratualmente o que de fato pertence a quem; consequentemente, não está determinado o que deve ser protegido. Não está determinado qual serviço o estado deve fornecer, nem o que deve acontecer caso o estado falhe em cumprir seu dever, e nem qual preço o "consumidor" de tais "serviços" deve pagar. Ao contrário: o estado determina unilateralmente as regras do jogo, podendo mudá-las, por mera legislação, durante o jogo.

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