1) A ORIGEM
O
Tempo e o Vento é um épico de Érico Veríssímo e um dos romances mais
importantes do autor, sintetizado em três volumes: O Tempo e o Vento, O
Continente e O Retrato.
Publicado
pela primeira vez em 1949, O Continente retrata a história do Rio Grande do Sul
entre 1745 e 1945 sob o ponto de vista da família Terra Cambará. A
história se inicia no território das missões quando uma Índia dá à luz uma
criança que se chamaria Pedro e que dá origem a uma família cuja história se
confunde com a do Rio Grande do Sul.
Pedro
engravida Ana Terra e seu filho vai crescer em um povoado que chamado Santa Fé.
Neste povoado brilha um certo Capitão Rodrigo Cambará, que se casa com a neta
de Ana Terra. Destemido e de comportamento valente, ele espelha bem o
personagem típico da época no romance.
O mundo descrito por Érico Verissimo é
inóspito, cheio de perigos e vive em um clima de guerras constantes. Afinal,
trata-se de uma região em que o mundo que os portugueses criaram na América faz
fronteiras e se rivaliza de forma permanente com o território espanhol em nosso
continente. Este clima permanente de tensão e desafios dá origem a uma
sociedade rústica em seu tempo e com características culturais muito próprias.
Raros são os livros que conseguem de forma
tão clara mostrar as entranhas de nosso sistema social. Ele nos dá elementos
para refletir sobre a origem de nossa cultura e de como se foi estruturando no
Brasil as possibilidades de construção de uma cultura política autoritária,
elitista e que só inclui o povo de forma lateral. Mesmo nas guerras por todos
disputadas os heróis são poucos e sempre pertencem às famílias dos
proprietários de terra. Vemos na obra o surgimento de um certo coronelismo com
cortes caudilhistas, com lugar muito especial para o discurso heroico. A violência
é a marca das relações sociais e a ausência de limites um elemento que ajuda a
instituir uma certa cultura política.
O sucesso de grande público é o primeiro livro
da série. Os dois seguintes, O Retrato e O Arquipélago são igualmente geniais.
Eles mostram os desdobramentos na estrutura do poder dos comportamentos
herdados da Colônia e do Império e como foi se consolidando um padrão de
comportamento coletivo que em tudo favoreceu a construção de uma sociedade
machista e excludente, onde o universo feminino é secundário e quase de segunda
classe e os impulsos masculinos mais selvagens ganham a cena como os que
definem o mundo. Mas, se esta característica construída historicamente marca o
romance gaúcho, ele também retrata bem o conjunto da sociedade brasileira,
igualmente desigual e excludente, onde negros, pobres e mulheres tem uma
espécie de cidadania de segunda classe.
Não
por acaso o personagem dos dois últimos livros tem o mesmo nome de seu
antepassado: Rodrigo Cambará. Mas, ele é médico formado em Porto Alegre, bem
cultivado e de hábitos sofisticados. Consumidor do pensamento positivista, da
música clássica tocada em seu gramofone e de todos os modismos do início do
século XX. Mas, dentro dele habita o passado, o heroísmo que agora aparece por sua
opção pelas revoluções políticas como a de 1923 no Rio Grande do Sul ou a de
1930 que levou Getúlio Vargas ao poder.
2)
NOSSO TEMPO
O terceiro livro mostra como o poder vem se fragmentando no mundo em que vivemos e que esta fragmentação não se limita aos efeitos da internet. É um fenômeno muito mais complexo.
Nesta perspectiva, o poder está passando dos que tem mais
força bruta para os que tem mais conhecimento. Hoje ele está mais fácil
de obter, mais difícil de utilizar e mais fácil de perder. Organizações
terroristas são prova concreta.
Vivemos em uma época de abundância e
temos mais de tudo. A produção econômica mundial aumentou cinco vezes desde
1950. Há mais 2 bilhões de pessoas no mundo do que havia duas décadas
atrás. A produção aumentou, a população
aumentou, a riqueza aumentou, formou-se uma classe média importante em termos
globais. A soma destes mais gera uma classe média impaciente e bem informada,
que quer um progresso mais rápido do que aquele que os governos são
capazes de oferecer e cuja intolerância tornou-se uma poderosa arma política.
São estes atores que estão em grande parte colocando em questão as velhas
estruturas de poder. São para eles as razões de fundo para fenômenos como os
movimentos das ruas no Brasil em 2013 e as mais recentes deste Século XXI.
Um dos aspectos importantes da
fragmentação do poder é a enorme mobilidade adquirida em tempos de muita
mobilização. As revoluções do mais e da mobilidade criam e fortaleceram uma
nova classe média cada vez mais exigente e cada vez mais distante dos
velhos mecanismos de poder e controle social. Isto acabou por produzir uma
revolução da mentalidade. Esta nova mentalidade, associada aos mecanismos que a
tecnologia oferece hoje estão de fato reconfigurando o poder e mudando a
vida.
Até a próxima
*Baseado
no texto de João Gualberto Vasconcellos.
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